Nos diagnósticos diferenciais da mononucleose, a sorologia dá a última palavra
Outras infecções agudas que cursam com linfadenopatias não podem ser distinguidas da doença só por sua apresentação clínica

Em indivíduos imunocompetentes da mesma faixa etária que os acometidos pela mononucleose infecciosa, convém considerar igualmente a possibilidade de infecções agudas por citomegalovírus (CMV) e por Toxoplasma gondii, que são capazes de produzir quadros clínicos indistinguíveis. Ambas têm, como marco, a linfadenopatia febril de curso agudo, podendo se associar, embora menos frequentemente, à faringite e à esplenomegalia. Na citomegalovirose, como se não bastasse, as alterações no hemograma revelam-se as mesmas dos casos em que o EBV figura como agente etiológico. Já na toxoplasmose, embora o relato de algum dado epidemiológico possa sugerir o diagnóstico, não é raro que esse vínculo se mantenha desconhecido. Portanto, também nessas duas infecções, a comprovação diagnóstica não prescinde de sorologia específica (veja tabela).



Parece EBV, mas pode ser CMV ou toxoplasmose


CMV

Toxoplasmose


Sutis diferenças clínicas

• Evolução mais insidiosa

• Sintomas menos intensos e mais prolongados

• Menor repercussão no estado geral do paciente

• Possibilidade de febre como sintoma isolado, o que também coloca a infecção entre os diferenciais de febre de origem indeterminada

• Presença de dado epidemiológico evidente, como ingestão de carne crua ou malpassada ou exposição a gatos

• Baixa probabilidade de faringite

• Linfonodos mais dolorosos à palpação

Diagnóstico definitivo

Presença de anticorpos IgG e IgM contra o vírus, os quais são habitualmente positivos quando o paciente procura o atendimento pela primeira vez

Presença de anticorpos IgG e IgM – muito embora os da classe IgM possam aparecer isoladamente por um período transitório, sendo, a seguir, acompanhados de IgG positiva



Não se esqueça do HIV

A infecção aguda pelo HIV pode também originar um quadro muito parecido com o da mononucleose infecciosa. Em 50-90% dos pacientes, a síndrome retroviral aguda ocorre entre uma e quatro semanas após a exposição ao vírus, manifestando-se por febre e linfadenopatia generalizada em mais de 90% dos casos, apesar de haver, com frequência, faringite, esplenomegalia e exantema maculopapular. No hemograma, é comum a linfopenia, mas podem surgir linfócitos atípicos. Como os anticorpos tornam-se detectáveis a partir de quatro semanas depois da aquisição da infecção, a sorologia nem sempre faz o diagnóstico. Antes disso, diante de suspeita consistente em paciente com história de exposição de risco, há indicação de realizar a PCR em tempo real no sangue – aliás, a única situação em que se recomenda o teste molecular para diagnosticar a infecção não congênita pelo HIV. O exame, porém, não dispensa a confirmação sorológica no momento oportuno, já que, dada sua alta sensibilidade, pode haver até 1% de falso-positivos.


As técnicas de biologia molecular habitualmente não são necessárias para o diagnóstico diferencial das linfadenopatias agudas febris descritas, servindo para outros momentos dessas infecções, mais precisamente nas doenças relacionadas à reativação de tais agentes em indivíduos imunossuprimidos, conforme mostra a tabela abaixo.

Particularmente em pacientes com suspeita de CMV reativado, a PCR quantitativa em tempo real tem elevada sensibilidade, razão pela qual vem sendo o método mais utilizado nesse cenário. Em relação à antigenemia PP65, a técnica é superior porque não sofre interferência da contagem de neutrófilos, mantendo-se altamente sensível, mesmo em neutropênicos.


Aplicação dos testes moleculares em imunossuprimidos

Agente

Teste

Aplicação

EBV

PCR em tempo real

Contribui para o diagnóstico de doença linfoproliferativa pós-transplante, que ocorre tardiamente em transplantados de órgãos sólidos

CMV

PCR quantitativa em tempo real

Avalia o aumento da carga viral em amostras sequenciais de sangue (importante para inferir a possível reativação do vírus e para a condução de estratégia terapêutica preemptiva)

Antigenemia PP65

Pesquisa leucócitos polimorfonucleares que contêm antígenos do vírus pela técnica de imunofluorescência

PCR qualitativa

Serve para uso em materiais como liquor e fragmentos de tecido

Toxoplasma gondii

PCR em tempo real

Liquor: confirma a neurotoxoplasmose em pacientes com aids e lesão expansiva no sistema nervoso central

Sangue: diagnostica a doença disseminada pós-transplante de células-tronco hematopoéticas e de órgãos sólidos



Às voltas com a toxoplasmose na gestação

Uma vez que, na infecção pelo T. gondii, a IgM específica pode persistir positiva por até dois anos após a doença aguda, não é raro se deparar com essa situação no pré-natal. Mas o teste de avidez de IgG permite esclarecer esses casos com segurança, visto que um índice de avidez inferior a 30% indica IgG de produção recente e, portanto, infecção primária ocorrida há menos de três meses. Diante da confirmação de doença materna adquirida durante a gestação, ou mesmo de sua alta probabilidade, entra em cena a PCR em tempo real no líquido amniótico ou no sangue do cordão umbilical. A amniocentese por volta de 18 a 21 semanas gestacionais apresenta sensibilidade mais alta e é mais segura para o feto do que a cordocentese, de modo que está virtualmente recomendada para todos esses casos.

01 de março de 2013